A usurpação de competência do juiz de primeiro grau que autorizou mandados de busca e apreensão em imóveis do deputado federal Josimar Cunha Rodrigues, mais conhecido como Josimar Maranhãozinho, na avaliação de magistrados e advogados, é considerada ilegal e coloca em risco toda a Operação Maranhão Nostrum.
As suspeitas de ilegalidade e inconstitucionalidade vieram à tona depois da publicação de uma análise do titular do blog mostrando que a operação do Gaeco contra o parlamentar pode ter sido ilegal.
Se for declarado a incompetência do juiz Francisco Ronaldo Maciel Oliveira, da 1ª Vara Criminal da Comarca da Grande Ilha de São Luís, para a análise do caso, tendo em vista que a investigação envolve um deputado federal, todos os atos realizados na operação de ontem podem ser anulados pela Justiça Federal.
A chance disso acontecer existe, sim. Não custa citar, por exemplo, a teoria dos “frutos da árvore envenenada”, nascida de jurisprudência da Suprema Corte norte-americana, segundo a qual, se a árvore está envenenada, todos os seus frutos também estão.
Essa fundamentação se adequa a todas as decisões judiciais dos tribunais superiores. Em junho de 2019, o Plenário do STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu que juízes de primeiro grau não podem autorizar medidas invasivas que digam respeito a atos de senadores em pleno mandato. Na época, o tribunal anulou todas as provas, inclusive grampos telefônicos, de operação da Polícia Federal que investigou atos de policiais do Senado cometidos por ordem de senadores.
Um ano depois, em novembro de 2020, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu a nulidade de operação de busca e apreensão determinada pela 6ª Vara Criminal de Brasília no âmbito da Operação Grabato, deflagrada para apurar supostas ilegalidades na contratação de serviços e equipamentos para o hospital de campanha montado no Estádio Nacional de Brasília durante a pandemia da Covid-19. Como consequência, o colegiado declarou inválidas as provas obtidas na diligência policial.
O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) já havia declarado a incompetência da vara criminal para a análise do caso, tendo em vista que a investigação envolve valores do Fundo de Saúde do DF, que são repassados pela União ao governo local.
Desembargador aponta falha
Foi baseado nisso que o desembargador Guerreiro Júnior, do Tribunal de Justiça do Maranhão, levantou dúvidas sobre a competência da Justiça Estadual para autorizar operação contra o deputado federal.
Nas redes sociais, ao comentar postagem do próprio deputado – questionando o fato de que a operação foi desencadeada pelo Estado, após autorização de juiz de 1ª instância – Guerreiro Júnior citou entendimento segundo o qual, mesmo na fase de investigação, é do STF a competência para processar casos contra deputado federal supostamente envolvido em ilícito penal.
“Segundo julgamento da Corte Suprema do Brasil a competência do STF, quando da possibilidade de envolvimento de parlamentar federal em ilícito penal, alcança a fase de investigação, materializada pelo desenvolvimento do inquérito (STF: Inq. 2842 – DF)”, afirmou.
Conduta questionada
A repercussão negativa da Operação Maranhão Nostrum trouxe à tona um pronunciamento do ex-deputado Raimundo Cutrim (PCdoB) em março de 2018, na tribuna da Assembleia Legislativa, onde declarou que o juiz Ronaldo Maciel e um promotor [não identificado por ele] estariam praticando crimes.
Na época, o parlamentar comentava sobre a suposta quadrilha de contrabandistas formada por policiais que está sendo investigada pela SSP/MA – Secretaria de Segurança Pública do Maranhão. Em relação ao juiz, o deputado disse desconfiar da parcialidade do magistrado.
“Então será que o juiz está sendo parcial? O Dr. Ronaldo Maciel? Eu tenho minha desconfiança, porque ele sabe que não é competência dele. Agora eu quero ver o seguinte… Como é que fica o Conselho Nacional de Justiça? De braços cruzados? Para que foi criado? Como fica o Conselho Nacional do Ministério Público? De braços cruzados? Como fica o procurador da República do Maranhão? Não são guardiões da Constituição? Como é que fica? Eu desafio aqui quanto a competência. A competência é da Justiça Federal, não é da Estadual. A boca miúda me disse que o secretário foi lá ao juiz pressionar: ‘Doutor, o senhor não vai prender o delegado, eu vou ficar desmoralizado’. Será que houve? Eu não sei, mas me disseram. Eu não sei disso, mas é o que se houve da boca miúda”, declarou o deputado.
Magistrado esclareceu
Após as declarações proferidas por Raimundo Cutrim, o juiz falou que o deputado precisava “conhecer processo penal”. Além disso, chegou a esclarecer sua competência em relação ao processo levantado pelo parlamentar na tribuna da Assembleia.
“O que o deputado precisa é conhecer processo penal, que ele não conhece. A minha jurisdição é residual, eu só posso atuar naquilo que não é da Justiça Federal, só que a jurisprudência pacífica do STJ é no sentido de que só se envia para a Justiça Federal quando estiver devidamente caracterizada a competência no caso. Há, inclusive, jurisprudência de que quando a investigação é iniciada pela Polícia Estadual ou Federal e há dúvida de quem seja a competência os autos, continua-se com a investigação até que se prove a competência. Na hora que estiver concluído o inquérito e eu tiver a conclusão de que a competência é da Justiça Federal, eu remeterei imediatamente à Justiça Federal”, concluiu.
O que mudou?
O caso foi em 2018, mas de lá pra cá, tanto o STJ quanto o STF, firmaram vários entendimentos determinando que juiz de primeiro grau não pode autorizar medidas que atinjam congressistas ou envolva competência da Justiça Federal.
Em tempos de desinformação e pandemia, o blog do Isaías Rocha reforça o compromisso com o jornalismo maranhense, profissional e de qualidade. Nossa página produz diariamente informação responsável e que você pode confiar.