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Depois do chocante relatório do inquérito policial divulgado pela Polícia Federal em novembro do ano passado, era evidente que a Procuradoria-Geral da República (PGR) apresentaria uma pesada denúncia contra Jair Bolsonaro, Braga Netto e todos aqueles que, sob a liderança deles, conduziram uma ação ilegal com o objetivo de manter Bolsonaro no poder a qualquer preço. A avalição é do jurista Rafael Mafei, professor de Direito da Universidade de São Paulo (USP) e da ESPM, em artigo publicado em O Globo.
Apenas se especulava se uma única acusação cobriria todas as suspeitas que recaem sobre Bolsonaro (que incluem ainda o desvio de bens valiosos doados ao Estado Brasileiro por autoridades árabes e a alteração de registros públicos de vacinação), além de quem seriam os outros acusados. Não houve denúncia completa, porém, Paulo Gonet Branco afirmou que outras acusações ainda estão a caminho. A primeira leva de denúncias, que incluiu Bolsonaro e Braga Netto, totalizou 34 pessoas.
Além deles, irão se espremer no banco dos réus outros ex-integrantes do governo, como os generais Augusto Heleno e Paulo Sérgio Nogueira e o ex-assessor especial da Presidência Filipe Martins; figuras que se notabilizaram por seu apoio público e instrumental à tentativa de virada de mesa eleitoral, como o ex-comentarista da Jovem Pan, Paulo Figueiredo Filho (que leu no ar um manifesto golpista e nomeou os generais que resistiam à intentona, para que fossem coagidos a aderir); Silvinei Vasques, que comandou uma operação policial de coação a eleitores nordestinos digna das trapaças eleitorais de um século atrás; além, é claro, de Mauro Cid, o longa manus de Bolsonaro cuja colaboração permitiu puxar o fio do novelo que enrolou o ex-presidente. Os demais denunciados são principalmente militares envolvidos nos atos de execução do golpe frustrado.
Uma denúncia deve ser avaliada pela sua habilidade de descrever de forma clara os acontecimentos e seus autores, fornecer evidências que os fundamentem e destacar claramente as leis penais infringidas por cada indivíduo. Isso possibilita que as pessoas acusadas, caso a denúncia seja aceita, possam se defender. A peça que a PGR apresentou ontem parece cumprir completamente esse requisito.
A acusação feita pelo Procurador-Geral é notável por organizar a profusão de informações recolhidas pela Polícia Federal desde janeiro de 2023, que fomos gradualmente apresentando desde aquele momento. A acusação distinguiu claramente entre pensamentos e ações preparatórias (que não são puníveis) e ações concretas que, nos crimes de golpe de Estado e tentativa de supressão do Estado de Direito, levam à completa configuração do crime assim que são realizados. Do ponto de vista legal, um golpe tentado e não bem-sucedido é considerado um golpe consumado, possibilitando a punição total dos seus autores, independentemente da sua incompetência.
Na leitura de Gonet, Bolsonaro e seu entorno convenceram-se, desde a anulação das condenações de Lula, de que a cúpula do Judiciário conspirava contra sua reeleição. Sob esse pretexto, o ex-Presidente e seus auxiliares mais fiéis, muitos deles agora seus corréus, trabalharam entre o jogar sujo nas eleições (praticando ilícitos que já o levaram à inelegibilidade) e o virar a mesa caso – mesmo jogando sujo – fossem derrotados, como já previam as pesquisas. O 8 de janeiro, diz a PGR, foi “a última esperança” dos golpistas, facilitado por três dos denunciados que, valendo-se de posições chave no Governo do Distrito Federal, facilitaram a intentona destruidora.
Há argumentos jurídicos respeitáveis que Bolsonaro pode apresentar em sua defesa, como contestar a competência do STF ou a prevenção de Alexandre de Moraes para julgá-lo, ou denunciar a cumulação excessiva de crimes. Mas alegações semelhantes já foram reiteradamente rechaçadas pelo tribunal. O ex-presidente sabe que sua melhor chance está no Congresso Nacional. É de lá que ele espera uma anistia que cumprirá a profecia de que a história se repete como farsa.
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