Jair Bolsonaro — Isac Nóbrega/PR

Jair Bolsonaro pulsa aflição. Depois de três anos conduzindo a agenda política, mostra-se angustiado por estar sendo empurrado para o debate eleitoral sobre o que fez ou deixou de fazer, antes na pandemia e agora na crise inflacionária.

A raiva extravasada, em público, é parte do personagem que construiu em quase três décadas como “um deputado do baixo clero que discursava para as paredes” da Câmara.

Está seguindo o próprio manual, como sempre. No inicio de junho resolveu renegar a “Declaração à Nação” que assinou há exatos dez meses, quando escolheu recuar do anúncio de confronto aberto com o Supremo Tribunal Federal, no Dia da Independência, para salvar o mandato.

Voltou atrás: “Eu fui de um tempo em que decisão do Supremo se cumpre. Não sou mais.”

Naquele período, justificou-se a Debora Bergamasco, do SBT, com a insinuação de um jogo combinado com o juiz Alexandre de Moraes, do STF, sobre inquéritos criminais nos quais ele se destaca como suspeito, ao lado dos três filhos parlamentares e uma dezena de deputados federais aliados.

“Estava eu”— disse — “Michel Temer, um telefone celular na minha frente. Ligamos pro Alexandre de Moraes, conversamos três vezes com ele. Combinamos certas coisas pra assinar aquela carta [a “Declaração à Nação”, de 8 de setembro do ano passado]. Ele não cumpriu nenhum dos itens que combinei com ele”.

Nesse enredo de quase meia centena de palavras tem-se a seguinte cena: no Palácio do Planalto, o presidente da República telefona a um ministro do STF e combina “certas coisas” com o testemunho de um ex-presidente.

Temer, professor de Direito Constitucional, tem exata noção do significado potencialmente explosivo contido na insinuação. Reagiu com a polidez que o caracteriza ao desmentir Bolsonaro: “Não houve condicionantes e nem deveria haver, pois tratávamos ali de fazer um gesto conjunto de boa vontade e de grandeza entre dois Poderes do Estado brasileiro.”

Foi a Temer que ele recorreu, em maio de 1999, depois de propor no plenário dos deputados o fuzilamento do então presidente Fernando Henrique Cardoso e o fechamento do Congresso Nacional. Foi Temer, na época presidente da Câmara, quem deu-lhe a ideia de assinar uma carta de retratação para salvar o mandato.

Negação é uma constante na biografia de Bolsonaro. Faz, lamenta, sem se desmentir, e em seguida clama por tolerância. É comportamento padrão toda vez que se vê num beco sem saída.

Desta vez, o problema é com o eleitorado. Precisa de mais votos. No mínimo, uma dezena de milhões. Porém, sua rejeição segue estável em patamar recorde (acima de 50%). Só tem equivalência nas pesquisas aos índices de descrédito naquilo que diz e ao receio coletivo de piora das condições econômicas pessoais e familiares.

Só tem equivalência nas pesquisas aos índices de descrédito naquilo que diz e ao receio coletivo de piora das condições econômicas pessoais e familiares.

Por isso, já anuncia “mobilização contínua” nas ruas a partir do próximo 7 de setembro.

Sem plano consistente para o problema real dos eleitores, Bolsonaro recorre à sua alternativa predileta para situações críticas: o tumulto.


Com informações de José Casado, jornalista

Fonte: https://www.veja.abril.com.br

Em tempos de desinformação e pandemia, o blog do Isaías Rocha reforça o compromisso com o jornalismo maranhense, profissional e de qualidade. Nossa página produz diariamente informação responsável e que você pode confiar.