s negociações entre o governo do Maranhão e representantes da China Brazil Xinnenghuan International Investment – algo como “China Brazil New Energy Environment International Investment” -, mais conhecida como CBSteel, estão entrando em sua fase final para definir o plano de instalação de uma megasiderúrgica no Estado.
O investimento anunciado é de até US$ 8 bilhões – em duas fases – para produção de até 10 milhões de toneladas de aços longos. O projeto, que atraiu uma série de críticas do setor no Brasil, pode saturar um mercado já com excesso de capacidade.
Apesar disso, as autoridades maranhenses acreditam que até o fim do ano um acordo final para a construção da unidade seja alcançado. Os chineses já visitaram o Estado em quatro oportunidades desde o ano passado e agora deve ser realizado novo encontro no dia 24 deste mês. Técnicos ligados ao governo local encontram-se na China para entender melhor o empreendimento e acertar alguns pontos ainda pouco claros.
Em entrevista ao Valor, Simplício Araújo, secretário de Indústria e Comércio do Maranhão, explica que a intenção é conseguir que a região de Bacabeira – a 58 quilômetros de São Luís -, onde se planeja erguer a usina, seja considerada Zona de Processamento de Exportação (ZPE), o que levaria o negócio a obrigatoriamente vender 80% de sua produção no exterior. Mas, ao mesmo tempo, ele torce para que a fórmula das ZPEs seja alterada, para algo entre 30% a 40% destinado ao mercado interno.
“Isso tudo ainda está sendo negociado, mas acreditamos que uma proporção desse tipo, de 60% a 70% de exportações, seja viável”, afirma Araújo. “Além disso, queremos combinar com a empresa para que mais de 80% dos funcionários sejam brasileiros no início, e depois se instale um programa de capacitação para elevar essa quantidade.”
O cronograma, ainda informal, prevê o início da construção em 2018 e das operações até 2022. Nos cálculos do governo, entre empregos diretos e indiretos, o negócio pode gerar de 3.000 a 5.000 postos de trabalho na obra e 2.500 na fase operacional.
A questão é que esse plano avança justamente quando o mercado do aço brasileiro ainda está muito combalido, sem perspectivas de recuperação no curto e médio prazos. O consumo aparente, que já foi de 28 milhões de toneladas no pico histórico de 2013, deve fechar este ano em 18,2 milhões de toneladas, segundo o Instituto Aço Brasil.
A CBSteel prevê produzir na primeira fase do projeto 3 milhões de toneladas de fio-máquina, usado na fabricação de pregos, grampos, ganchos e outros itens. O plano é de chegar a 10 milhões de toneladas no futuro.
O excesso de capacidade é um problema no Brasil, mas também no mundo todo. É estimado que o mercado esteja saturado globalmente em quase 720 milhões de toneladas. Por aqui, 2016 deve acabar com um excesso de 20 milhões de toneladas e ociosidade de 38%.
De benefícios que o Maranhão vai oferecer, estão inclusos o terreno para a siderúrgica, de 20 quilômetros quadrados, e um desconto de 95% do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) – algo que o secretário admite ser “diferenciado”. Além disso, há conversas com o governo federal para que haja isenção de Imposto de Renda (IR) na entrada do equipamento e potencialmente descontos de PIS/Cofins mais à frente.
Se o montante de incentivos se confirmar, com beneplácito do governo federal, um representante da siderurgia no país diz que o setor vai brigar até na Justiça para contestar os subsídios em um momento que empresas estão parando altos-fornos e fábricas e demitindo mais de 40 mil empregados devido à falta de mercado.
A CBSteel é um veículo de investimentos que foi montado na China em agosto de 2015 com capital inicial de 50 milhões de yuans (cerca de R$ 27 milhões). Sua estrutura acionária contém uma mineradora, a Shandong Yiyuan Xingguo Mining, e uma siderúrgica, a Taishan Steel, além de dois fundos (um de Pequim). A holding é originada em Shandong, província chinesa onde se situa o porto de Qingdao, o segundo mais importante do país no comércio exterior de mineração e siderurgia.
Como a Taishan é uma empresa pequena em aço – 5 milhões de toneladas de capacidade instalada -, outras grandes foram chamadas, casos de Baosteel e a Wuhan, apurou o Valor. As conversas não avançaram devido a tentativas frustradas no passado de abrir operações no Brasil. A Baosteel chegou a negociar com a Vale a instalação de uma usina no Maranhão. Já a Wuhan associou ao grupo EBX, de Eike Batista, para levantar um empreendimento no porto do Açu.
A criação da CBSteel faz parte do projeto do gigante asiático de investir em capacidade industrial ao redor do mundo. Até 2020, o governo chinês quer investir em 12 setores estratégicos – do aço à infraestrutura de transportes e de energia, por exemplo -, como parte de seu plano quinquenal na área de “cooperação internacional”. Em maio do ano passado, logo após publicar essa intenção, Li Kequiang, primeiro-ministro do país, visitou o Brasil, quando assinou um termo de compromisso.
“Estamos no mapa da China há muito tempo”, declara o secretário maranhense. “Não só para processar o minério de ferro que vem do Pará, mas também por conta da segurança alimentar que provém do Mapitoba [Maranhão, Piauí, Tocantins e Bahia].”
Por isso, no projeto da siderúrgica a ideia é comprar a matéria-prima da Vale, que é extraída em Carajás, e conseguir escoar o aço fabricado por meio de um porto privado, dedicado apenas a essa atividade. O governo quer que Bacabeira se torne uma espécie de “smart city”, atraindo pessoas principalmente para trabalharem no empreendimento e na rede de serviços que será necessária para prover essa nova população.
Se foi Dilma quem costurou o acordo em 2015, agora o presidente Michel Temer parece também dar suporte à usina da CBSteel. Além da visita recente à China, na qual José Serra, ministro das Relações Exteriores, anunciou a instalação da usina no Maranhão. Araújo comenta que nas reuniões com o Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços houve retorno positivo.
“Estamos longe de dizer que o empreendimento está totalmente garantido. E nos preocupamos muito com as empresas nacionais”, ressalta Araújo. “Mas precisamos que o país volte a crescer e gerar empregos, o que vai reaquecer o setor e abrir espaço para projetos como esse. Não posso concordar com quem olha para o setor e acha que estará, no futuro, no mesmo patamar de hoje”.
Fonte: Valor Econômico